segunda-feira, 23 de junho de 2008

A menina das flores já não anda mais sozinha!


Ela estava sempre ali, linda. O trabalho dela era esse: vender flores para os casais apaixonados. Ironia do destino, ou não, ela estava sempre sozinha. Tinha em seus braços as flores mais belas; porém, ninguém a tinha nos braços, nem a cuidava como uma flor. Tinha de parecer sempre radiante pra que seu trabalho não parecesse tão chato, afinal, quem é que não gostaria de vender flores pra pessoas apaixonadas, com um brilho nos olhos ofuscante? Ainda mais ela que aprendeu a ler sozinha através de fábulas infantis daquelas com bruxas, plebéias, gatas borralheiras e príncipes encatados montados num cavalo branco e eixos dourados. Ela sempre achou que a culpa de ela ser sozinha era por conta de um feitiço de alguma bruxa que em algum momento passou por ela e assim decidiu que a sua vida devia ser amaldiçoada.
Mas alguma coisa aconteceu. Ela viu que crescera, seus pensamentos já não eram os mesmos. Notou que bruxa alguma poderia mudar a sua vida. Quem toma as rédeas de si própria é ela. Desde que seus pais e seu irmão morreram era assim. Decidir por ela mesma já não era uma opção, mas sim o único jeito de sobrevivência. Virava-se bem, morava numa pensão na qual pagava sua estadia com serviços de limpeza durante o dia. Aproveitava também pra vender umas flores pros hóspedes. Era na pensão que ela mantinha a sua estufa. E também foi na pensão que ela descobriu que o brilho nos olhos, aquele que ofusca, existia de verdade e que ela podia sentir.
Pela primeira vez ela vendeu uma flor e esta flor voltou pra ela. É simples: a menina das flores já não anda mais sozinha.

domingo, 22 de junho de 2008

a catarina quer falar

"Esse papel eu achei no chão
Escrevi diversos versos, turbilhão
Mas então eu percebi, doce ilusão
Esse papel não é meu, não é não!

É de um poeta calmo que me deu inspiração
Mas está sozinho sem seu retalho
Deve estar bebendo desde o talo
Para ver se esquece o que perdeu

E agora, o que faço
Finjo que nada aconteceu?
Findei mais um poema
E foi só o que ocorreu."

Catarina Bardet

sexta-feira, 20 de junho de 2008

O livro.


Ah, eu fiquei pensando por um intervalo de tempo por que diabos havia tantos livros na minha estante. Eu li muitos, mas nem a metade, talvez pela metade cada um que eu li. A importância daquilo já não era tão grande quanto eu achava que pudesse ser. Notei que no meio de tantos livros tinha uns que eu tinha lido, relido, gostado, desgostado, gostado de novo, folheado e enfim... Tá, fui dormir.
No outro dia, final do dia, noite escura, noite de frio, noite de bar, noite de vinho. Coloquei um livro o qual eu estava lendo em cima de um freezer que figurava na minha frente. Depois de um tempo, vieram pessoas perguntar sobre o que era o livro, ou argumentar a favor ou contra. De repente me veio o estalo, perfeito! Uma pergunta estranha, mas comum, adveio à minha mente: o que eu gostaria de ser realmente se eu não fosse eu (note o teor de maionese)? A resposta veio num instante e me pareceu tão óbvia: um livro. É, livro. L-I-V-R-O.
Fiquei pensando naqueles coitados estáticos da minha estante, muito empoeirados por sinal. Cheguei à conclusão de que pra cada um daqueles livros, há um leitor fascinado. Um alguém que o lê, relê, o cita, o venera, não dá bola pras críticas pejorativas...

Imagina agora seres um livro desses, do tipo preferido. És misterioso, complicado, surpreendente... Ler um livro uma, duas vezes, não é o bastante pra entender o que está escrito. Depende do dia que tu teve, dos acontecimentos, da visão de mundo... Eu queria ser daqueles livros que, quando relidos, apresentam uma realidade diferente do que meu leitor tinha quando me leu da primeira, ou da segunda, ou da terceira vez. Folheados, tateados, com prazer. Por mais em stand-by que eu estiver na estante, vou estar ativo no pensamento de alguém. Haverá sempre uma opinião formada sobre mim que não se abalará com críticas alheias.
Quando ele me lê, viaja junto comigo, dou-lhe momentos de prazer, momentos diferentes a cada folha, a cada leitura (releitura...). Ser levado pra todos os lugares: praia, serra, consultório médico. A companhia perfeita pra qualquer hora, sirvo pra relaxamento. Não quero ser um personagem de jeito algum, quero ser o cenário ao qual ele está envolvido, o local onde tudo acontece, os muros da fronteira sem demarcação. Eu quero ser um livro, enfim, quero ser relida com carinho na ponta dos dedos de quem sinta a diferença em estar comigo. Adote um livro, tenha um no coração.


no radinho: Sonífera ilha